sábado, 8 de dezembro de 2007

Como tudo começou

Ontem tive uma visão fantástica.
O X estava gordinho, bem disposto, pele hidratada, com capacidade de expressão verbal e com maior amplitude de movimentos. Fantástico!
Tudo começou numa bela saída de terreno em que após a visita de uma pessoa a uma pensão do Porto a equipa foi confrontada com o facto de existir o X com SIDA, acamado e completamente dependente. Não tinha as mínimas condições no quarto em que se encontrava.
Era o pico de Verão e tinha uma garrafa de água ao sei lado, garrafa que nada lhe valia uma vez que não conseguia pegar nela.
Escorria suor, estava completamente encharcado em urina. O quarto cheirava mal, pouco se mexia. Foi assim que o fomos encontrar uns dias depois. Demos-lhe banho, levantámo-lo para uma cadeira de rodas onde foi alimentado. Ajudámo-lo a fumar (único vício que ainda tinha) pegando no cigarro e colocando-o na sua boca.
Após múltiplos esforços de uma verdadeira equipa de multidisciplinar de operacionais e voluntários foi possível encaminhar o X para uma Unidade de Cuidados Continuados onde recuperou uma parte da sua qualidade de vida. Meses mais tarde, após reunir condições foi para um lar.
Fomos visitá-lo ontem ... O X estava gordinho, bem disposto, pele hidratada, com capacidade de expressão verbal e com maior amplitude de movimentos. Fantástico!

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Há dias assim

Hoje "ouvi sermão".
Incrível. Ouvi sermão de quem me conhece há alguns meses e pelos vistos já me conhece bem.
Infelizmente esta semana perdi mais um membro da minha família. Senti-me completamente oca por fora e por dentro.
Além disso os problemas têm sido mais que muitos, o que faz com que não ande com muita disposição para sorrir e muito menos para desabafar.
É um dos meus grandes defeitos e que, admito, me torna vulnerável a momentos de profunda tristeza e frustração. A momentos em que equaciono tudo na minha vida e tento fazer um balanço. A momentos em que penso se poderia ter escolhido outro caminho.
Seria muito mais fácil se conseguisse partilhar isso com os meus amigos mas é mais forte do que eu. Se o fizer "descambo" e perco as minhas defesas perante os outros. Por isso para mim torna-se mais fácil simplesmente não o fazer.
OK. Fica o "sermão". Mais um no meio de tantos outros. Pode ser que um dia eu consiga fazer o que me pedem e finalmente largue a minha armadura.
Só espero que depois não saia mais magoada!
Fica o pensamento.
Mas porque há dias assim também há outros muito melhores. Amanhã será um deles!

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Dia 17 de Outubro

Porque não foi publicado na comunicação social e vale sempre a pena ler!

COMUNICADO DE IMPRENSA
Porto, 17 de Outubro de 2007
Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza:

Apoio às Pessoas Sem-Abrigo do Porto por Médicos do Mundo.
Os últimos meses têm sido acompanhados pela diminuição da capacidade de resposta por parte das instituições à problemática da população sem-abrigo da cidade, ou pelo seu encerramento completo, ou pela diminuição das actividades desenvolvidas por falta de verbas. Desde logo, quem fica mais prejudicada é a população beneficiária, que, com as respostas a escassear, registará uma evolução negativa no seu processo rumo à reintegração social.
Não obstante as dificuldades, de Janeiro a Setembro de 2007, o projecto Porto Escondido da Delegação Porto de Médicos do Mundo prestou apoio efectivo a 583 pessoas, sendo que 75 delas já são co-responsáveis pelo seu projecto de vida, estando numa etapa evolutiva rumo à reinserção social. Desde Abril de 2002, o projecto perfez um total de 1200 utilizadores contactados desde o seu início.
Em 2007, objectivo tem sido aumentar o acesso dos utilizadores aos meios de inclusão social no âmbito dos quatro níveis de actuação (prevenção dos riscos da exclusão, emergência social, transição e integração permanente). Os principais tipos de intervenção na esfera dos cuidados de saúde, higiene e conforto, educação para a saúde e apoio social e psicológico (ver gráfico abaixo).
Num trabalho realizado em Janeiro deste ano, encontramos o seguinte perfil de pessoa sem-abrigo: sexo masculino; entre os 20 e 40 anos;Português; 4.º ano de escolaridade; desempregado; tempo médio de permanência como sem-abrigo: entre 1 a 5 anos; a viver em espaços públicos; com problemas de documentação (contumácia e sem documentação); com algum apoio social (Segurança Social e Fundação para o Desenvolvimento Social / projecto “Porto Feliz”); recursos financeiros: 100 a 200€/mês; e problemas de saúde relacionados com consumo de substâncias, problemas neuro-psiquiátricos e dentários.
Todos – governo e sociedade civil – devemos apostar no investimento em termos de reinserção social em relação às pessoas sem-abrigo que se encontram nessa condição, particularmente, há menos de um ano. Por isso, é fundamental a continuidade dos projectos existentes.

Lutamos contra todas as doenças, até mesmo a injustiça...
Para mais informações, contactar:
Projecto Porto Escondido (Delegação Porto, Médicos do Mundo)
Telefone: 22 9039064
Telemóvel: 96 8702491

Médicos do Mundo é uma Organização Não Governamental de ajuda humanitária e
cooperação para o desenvolvimento, sem filiação partidária ou religiosa. Em Portugal, a
organização foi fundada em 1999, fazendo hoje parte da Rede Internacional Médicos do
Mundo, constituída por 12 delegações (Argentina, Bélgica, Canadá, Chipre, Espanha, Estados
Unidos da América, França, Grécia, Itália, Portugal, Suécia e Suíça).

Mais uma vez ... vulneráveis somos todos

Realmente há dias de manhã que uma pessoa há tarde não devia sair à noite.
É desesperante trabalhar e lutar por um projecto quando se vê que tudo à volta está a remar contra a maré.
É difícil, muito difícil lutar contra toda uma conjuntura e uma atmosfera de negativismo que só nos põe para baixo.
Quando temos a certeza do que queremos e como queremos. Quando temos a certeza de que somos capazes e de que tudo fizemos para obter algo. Quando simplesmente sabemos que vai ser um sim....
Afinal temos não um mas dois NÃOS seguidos, para magoar ainda mais.
Como lutar com toda a garra quando não há meios para tal a não ser a capacidade de trabalho e o esforço de todos??? Como lutar quando os nossos pares esperam que o resultado final seja a derrota???

Há dias assim, em que nos sentimos extremamente vulneráveis.
Há dias em que apetece simplesmente dizer BASTA e abandonar tudo como está. Mas depois pensamos nos outros.
OS OUTROS. Aqueles que precisam de nós. Aqueles que já não têm mais onde recorrer e que em nós encontraram um Porto de Abrigo. Aqueles que dependem de nós. São esses que nos fazem pensar que amanhã tudo será melhor, mais e melhor!!
Por eles vale a pena ir para a cama e dormir.
Ter o nosso momento de vulnerabilidade não é sinal de fraqueza e sim sinal de que afinal até somos humanos - embora os outros pensem que somos uns SUPER-HERÓIS! Mentira. Todos nós temos os nosso momentos.
Que sejam apenas momentos...

Fiquem com a ideia que embora existam dias assim o amanhã vai ser sempre melhor se nós quisermos!

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

NA PELE DE UM SEM-ABRIGO

É sempre muito difícil para um voluntário, por mais experiência que tenha, colocar-se na pele de uma pessoa sem-abrigo, principalmente por já ter consolidade a sua própria personalidade e estrutura familiar.
Na minha modesta opinião, embora seja uma palavra que define uma situação, esta inclui duas formas completamente opostas em que uma é naturalmente maioritária em relação a outra, mas que existem, e das quais não nos podemos alhear.
Existe a pessoa sem-abrigo que pelas contingências da vida, familiares ou laborais, vão parar a rua contra a sua vontade e existe a pessoa sem.abrigo que por sua própria opção e comodidade na sua maneira de ver a vida escolheu esta situação.
São casos que devem ser tratados e apoiados com uma sensibilidade diferente, porque os objectivos de cada um não são os mesmos.
Depois desta minha opinião respeitante ao conceito de pessoa sem-abrigo e falando na sua grande maioria que é o que se encontra na situação contra a sua vontade, é natural que vendo-se completamente abandonados pela Sociedade e muitas vezes sendo-lhe negada a ajuda que necessita procure algo que lhe faça esquecer a trágica situação em que está e normalmente existem duas companhias que mais tarde ou mais cedo, quase sempre empurrados por terceiros, os vão AJUDAR a esquecer e que são duas companhias que se tornam inseparáveis - DROGA/ÁLCOOL.
É nessa trágica situação em que estas pessoas - que fazem parte da Sociedade em que vivemos - normalmente acabam por cair.
Muitas destas situações poderiam ser resolvidas e, pessoas que o desejam, recuperadas se houvesse uma Segurança Social mais activa e com mais meios para que essa ajuda fosse mais longa no tempo de desintoxicação para que a recuperação pudesse frutificar.
Sou com muito orgulho voluntário dos MDM e no terreno tento com a ajuda de todos os elementos das equipas de rua remediar o melhor possível a situação deplorável em que estas pessoas se encontram.
Para isso contamos com a fabulosa equipa do CASSA, onde médico, psicólogo, enfermeiro e assistente social, tentam encaminhar e ajudar quem precisa e essencialmente quem quer para a possível solução dos seus problemas.
Não é tarefa fácil e normalmente por falta de meios e ajuda das entidades oficiais são mais as derrotas do que as vitórias, mas a vontade e o altruísmo de todos os voluntários e equipa de apoio não permitirá a desistência, e por isso o Projecto Porto Escondido sem desfalecimentos e com uma vontade férrea de todos os seus elementos vai continuar para o bem de alguns que esquecidos por tantos nunca serão esquecidos pelos MDM.
Autoria: João Sá

quinta-feira, 7 de junho de 2007

Media

Mais uma vez o sensacionalismo lançado pelos media faz com que os factos de uma só história não sejam revelados sob todos os pontos de vista.
Tem-se falado muito, ultimamente de uma menina russa que terá de ser expulsa de Portugal porque a mãe também o será.
Muitas são as histórias contadas nos media - já se deram ao trabalho de consultarem a imprensa? vejam a disparidade existente nos dados que são revelados. O mais engraçado é que os dados são transmitidos apenas na óptica da família de acolhimento.
E a mãe biológica? Alguém se deu ao trabalho de pensar como é que ela se poderá estar a sentir? É ela que vai ser expulsa, é ela que está efectivamente num Centro de Instalação Temporária por ordem do tribunal mas É ELA QUE VAI FICAR SEM A FILHA!
Lágrimas não chegam para expressar a revolta desta mãe.
Palavras não chegam para descrever o que a criança deve estar a sentir - dividida entre o sentimento que nutre pelas duas famílias.
Abordar a informação nessa óptica? Pois, parece-me que não é do interesse dos órgãos de comunicação social.
Por favor, façam um esforço por ouvirem todas as versões de uma mesma história e pensem nos sentimentos envolvidos.
SINTAM A INFORMAÇÃO QUE DÃO!

quarta-feira, 18 de abril de 2007

Estado da saúde

Sexo masculino, 32 anos. Recorre ao serviço de urgência de um hospital e é diagnosticado com uma doença que requer repouso permanente, elevação dos membros inferiores, medicação injectável a horas fixas e análises frequentes.
Atitudes?
- Alta para a rua com indicação de drenagem postural dos membros (em cima de um caixote do lixo).
- Carta para o médico assistente (não tem nem está perto de o ter).
- Injectáveis - OK - pode sempre pedir a um colega toxicodependente para administrar a medicação mas ... oops ... não é endovenosa, é subcutânea, e agora?
- Carta para entregar no serviço de análises clínicas às x horas de y dia. Sim, é porreiro, se ao menos o pobre o homem pudesse ler!
- Mais, toxicodependente. Onde? Quando? Quem?Porque? Bem o porquê é fácil: dorme na rua e tem ar de "maltrapilho"


Assim vai o nosso pais e a nossa saúde.
As necessidades das pessoas são descuradas face à sua condição e aparência.


Estejam descansados. Foi preciso um dia inteiro de trabalho e 3 elementos da equipa a trabalharem intensivamente para a situação ter um final com dignidade. Meia elástica, muleta, medicação administrada a tempo e horas, companhia para a realização das análises, um quarto para dormir enquanto a saúde não estabilizar, 3 refeições servidas. Nada mal!

domingo, 15 de abril de 2007

5 ANOS

5 anos decorreram desdes que começamos com a nossa aventura no voluntariado.
5 anos de aventuras, principalmente com o nosso meio de transporte.
5 anos de esperança, que tentamos de algum modo incutir nos outros.
5 anos de novidades. Porque todos os anos as novidades surjem para tornar a nossa intervenção mais e melhor.
5 anos de mudança, porque foram muitas as fases de mudança pelo qual já tivemos de passar.
5 anos de partilhas, entre voluntários e utilizadores.
5 anos de alegrias, quando nos deparamos com um sorriso aberto que espera por nós.
5 anos de tristezas, quando apesar de todos os esforços de todos vemos alguém partir ...
5 anos de desafios, batalhas travadas, inovação, avanços e retrocessos, crescimento, maturidade e de partilha.
5 anos de credibilidade.
5 anos ÚNICOS.

Parabéns a todos nós!!

domingo, 1 de abril de 2007

Família

Esta semana tivemos que fazer algumas mudanças nas nossas instalações.
Infelizmente alguns colegas não puderam colaborar. No entanto, foi interessante reparar que os que o fizeram (alguns) contaram com a ajuda dos seus familiares.
Não deixa de ser interessante...
Nós que trabalhamos com a população mais vulnerável da cidade temos alguma dificuldade em lidar com a pressão da nossa família.
É pertinente que os nossos familiares queiram o melhor para nós. Sendo que o melhor será um trabalho estável e algum tempo de lazer e de convívio com eles. Logo aí se coloca um entrave - o tempo investido no trabalho de voluntariado.
Já repararam que enquanto voluntários todos clamam a nossa atenção? São os coordenadores dos projectos, os utilizadores, os outros voluntários, os amigos, a família, etc.
Temos de saber gerir muito bem o nosso tempo e a nossa motivação. Temos de lidar com os conflitos inter e intra-pessoais e com a família.
Se por um lado nos apoio e se orgulha do facto de estarmos a exercer uma actividade de voluntariado, por outro cobra-nos mais atenção e disponibilidade de tempo.
É muito complicado para nós lidar com estas questões mas no final - vale sempre a pena.
Vale a pena uma noite mal dormida (depois de termos contactado com a realidade nua e crua dos outros...)
Vale a pena o frio e a chuva (quando em troca recebemos um sorriso aberto)
Vale a pena a confrontação (e ver o outro repensar as suas prioridades)
Vale a pena deixar estar ... (porque um dia, alguém se vai lembrar do que dissemos ou fizemos e vai tentar agir).

Sem a estabilidade e o apoio da família seria muito complicado termos a força suficiente para continuarmos com esta actividade, tantas vezes exigente.

À nossa família,

Obrigada

sábado, 31 de março de 2007

O que é que me faz correr?

Esta é a questão que me colocam.
Pois ... nem eu sei o que me faz correr.
A vontade de ser mais e melhor?
O desejo de ultrapassar os meus próprios limites, muitas vezes físicos?
A conquista da perfeição? Não, esta não. A luta pela perfeição, tendo sempre em mente que ninguém é perfeito.
A força de vontade.
A garra.
Tentar chegar ao outro sabendo ele que eu vou estar ali sempre ... esperando que ele também esteja sempre lá para mim. Ah! Ah!
Ultrapassar obstáculos.
Levar "porrada".
A impetuosidade, a teimosia, o desespero, a desilusão, a alegria, a ...
Lutar pelos meus sonhos. Sim, é isso mesmo. Lutar pelos meus sonhos. Isso é que me faz correr. E poder dizer no final que VALEU A PENA, apesar de tudo.

quarta-feira, 21 de março de 2007

Para todos

Por motivo de mudança de endereço de email e impossibilidade de efectuar mudanças no blog anterior criei este novo.

Todos os que já conheciam o meu antigo blog (www.vulneraveis.blog.com) podem relembrar os artigos já publicados indo directamente ao mesmo.

As linhas de orientação são as mesmas bem como os objectivos.

Serve como espaço de reflexão para toda uma equipa de trabalho e grupo de amigos que trabalham com a população vulnerável da cidade do Porto.

TODOS estão convidados a participar!